Ainda consigo lembrar Na ténue rebentação Das ondas do teu mar Quando ouso mergulhar Cada vez mais fugaz O meu olhar Bem no fundo de ti Aquela outra maré Em que perdi o pé E a razão Mas os bramidos Da tua preia-mar Ou os gemidos Do teu amainar Que faziam a rotina De todos os dias Já não fazem soar Trombetas celestiais E até no céu Do teu olhar E também do meu Aos alvores matinais Tolda-os agora um véu De névoa fria O cheiro a maresia Começa a dar lugar Ao odor mais denso E menos apelativo Da terra molhada O sol que nasce em ti Brilha menos intenso E copia do Astro Rei O gesto furtivo Da carícia roubada Ou não consumada É a mudança de Estação Porque também o amor Tal como o Verão Perde o fulgor De forma natural Só que mais radical Definitivo e fatal Porque neste caso o processo Não tem forma de regresso
(Inspirado em partes iguais, no relembrar de vidas passadas e na observação atenta da imensidão deste mar de Vila Praia de Âncora em finais de Agosto deste ano de 2009)
Levanto-me (uma vez mais) instável como vara de vime fustigada por um vento inexistente e tacteio no escuro o espaço à minha volta em busca de algo a que me agarrar: podem bem ser as lianas dos teus braços ou o aconchego das bóias de salvação que nunca me recusaste em nenhum momento (mesmo naqueles em que não existindo qualquer emergência, eu te procurava…)
Qualquer um desses “meios de salvamento” por si só, seria capaz de me resgatar com êxito do abismo em que me sinto afundar mas em conjunto então, garantiriam seguramente a obtenção desse desiderato…
Mas não! O que as minhas mãos encontram - porque não te encontram - é o vazio, a ausência de qualquer ponto de apoio (e ausência é “encontrar” coisa nenhuma…)
E mesmo que já o soubesse, constato uma vez mais que vazio e ausência são características de todo o espaço físico em que tu não estejas presente. E por isso não poderia ocorrer outra coisa senão esta: Sem ti, sem as lianas dos teus braços, sem o teu corpo (e a bóia de salvação que sempre nele tenho encontrado) caio de novo e mais uma vez (quiçá a última, a não ser que voltes - fisicamente - porque na verdade, em espírito tu sempre aqui tens estado!)